NOTÍCIA | HAIKAA YAMAMOTO E A MÚSICA DO MUNDO

 

Haikaa: proposta de um canção "torre de babel". Foto: divulgação.

Além de Fernanda Takai, mais uma nipo-brasileira entra no concorrido mundo da música popular. É Haikaa Yamamoto,  36 anos, que se propõe a ser uma artista da “aldeia global”,  cantando  em várias línguas.  Seu objetivo é celebrar a diversidade cultural, com a canção “Work of Art”, que tem  oito minutos e é cantada  em 19 idiomas diferentes. Atualmente ela prepara a versão da canção em polonês.

Haikaa é uma típica cidadã do século 21.  Nasceu no Brasi e estudou no  Japão e nos s Estados Unidos. No  Japão, já cantava no grupo pop adolescente “Girls Club”.  Também participou da trilha sonora da novela para internet “Mina & Lisa”, sobre duas adolescentes nipo-descendentes, com a canção “Nananananana”.

A canção “Work of Art” está disponível no Youtube, aqui e também em seu site oficial, aqui.

14 LITERATURA | A PRIMAVERA DE MISHIMA

Ikeda, Koson, 1802?-1867?

Por Benedito Costa

Tanta tinta já foi derramada para se falar da tetralogia “Mar da Fertilidade”, de Yukio Mishima. Mas sua obra é inesgotável. Vão-se os tempos, mudam-se os hábitos mas está lá a obra de Mishima nos olhando com olhos de espanto, como costumo dizer.

Em particular, este mês pede uma palavrinha sobre a primavera e me ocorreu uma ideia bastante curiosa: a de que um dos livros de “Mar da fertilidade” chama-se “Neve de Primavera” e não “yukiyanagi[1]”. A escolha de Mishima deu-se para a neve mesmo, literal, e não para o nome da bela planta que floresce na primavera, enchendo ruas japonesas inteiras de forte beleza branca.

A escolha de Mishima não é tão óbvia e está inserida em seu modo peculiar de ver o mundo, lógico, o que nos permite uma reflexão. Mishima escolhe “Haru no Yuki”[2] como uma metáfora para o que ocorre com o amor trágico do casal Kiyoaki e Satoko. Esta tragicidade tomada aqui do modo mais comum de se entendê-la não é incomum na obra de Mishima, pois, em outros romances, o amor de dois personagens tivera cenário triste, dramático ou sem solução, com exceções aqui e ali, quando Mishima resolve reescrever um conto da tradição japonesa com fim feliz ( mas não sem ironia e um toque de perversidade).

No caso de “Neve de Primavera”, esta neve apontada pelo título, que é apenas um tipo de tantas neves (úmida, densa, de chuva, etc.), serve bem para a situação do que ele nos narra. A neve da primavera marca o fim do inverno, mas ainda faz frio. É como se o frio do inverno continuasse lembrado, ignorando calendários ou qualquer outro sistema de marcação humana. Ao mesmo tempo, mostra que o inverno está indo, e que uma nova época surge, tempo de acasalamento, de florescimento, de renovação. Mishima não ignora tal tradição, que não é comum apenas no Oriente. Em todos os lugares do planeta em que as estações são bem marcadas, a primavera é comemorada, havendo deidades representativas dela. É uma bela época, marcada, no Japão, inclusive, pela flora da(o) yukiyanagi. No entanto, no imaginário de Mishima, é uma época perfeita que serve como metáfora para a tragédia que se abaterá sobre o casal protagonista.

Ao mesmo tempo, Mishima não deixa de lado seu complexo modo de entrelaçar discursos. A tragédia que se abate sobre o casal não difere da tragédia que se abaterá sobre o Japão nos dois primeiros quartéis do século XX. Digamos que as metáforas nessa obra sejam metáforas sobrepostas.

Há uma gravura atribuída a Ikeda Koson que mostra uma ave negra pousada num galho de árvore coberta de neve. Há referências sobre a/o yukiyanagi. Esta ave negra no caule branco de neve/branco de flor (que virão?) serviria bem para ilustrar o pensamento de Mishima: preto sobre branco, realidades opostas brigando por espaço.

Sobre a questão dos opostos, também vale um comentário: tanto já se falou sobre a oposição “ocidente versus oriente” tanto na obra quanto na vida de Mishima. Tanto se falou sobre a contradição de seu discurso sobre a tradição e a modernidade. No meu entender, Mishima foi o autor de sua época que mais entendeu não esta oposição, esta questão binária, maniqueísta, e sim a complexidade de discursos existentes em seu país. No entender de Edward Said, o teórico da literatura e da História, não há exatamente um confronto entre o ocidente e o oriente e sim uma relação muito complexa, construída durante milênios, sem começo, fim ou meio.

“Mar da fertilidade” merece ser lida (a tetralogia toda) por muitos motivos, eu sei, mas agora na primavera eu começaria a leitura justamente por “Neve de primavera”, tendo como pano de fundo as floradas de yukiyanagi e a imagem de um corvo sobre um galho branco, gravura do século XIX, da melhor tradição da gravura japonesa.

Benedito Costa é professor de Literatura e critico de arte, autor do livro “Diante do abismo” (Benvirá, 2011).


[1] Salgueiro da primavera.

[2] Neve de primavera.

 

14 LITERATURA | A DAMA DO PAVILHÃO DE FLORES ROXAS

Podem wakas de mil anos fazer sentido no mundo de hoje? Em especial os tankas de uma corte refinada, em que sensibilidade e erudição eram requisitos sociais? A resposta é sim.

Regina Bostulim[1]

A gueixa morena criada por Joba Tridente. Foto: divulgação.

A era Heian[2] foi o período áureo do Japão. Começa em 794 quando o imperador Kammu ordena a construção de Heian-Kyo (Cidade da Paz e da Tranquilidade), atualmente chamada Kyoto. Dura quatro séculos, até 1185, período Kamamura, a época dos samurais.

O período Heian médio conheceu uma cultura aristocrática, em que florescem a religião e as artes, em especial a literatura. Enquanto o povo vivia de forma ignorante e rude, a nobreza vivia no luxo e na ociosidade. O esteticismo chegou a requintes, sendo os homens não guerreiros como os do período posterior, mas dândis, femininos em suas maneiras.

Mulheres da corte

The Genji Monogatari Emaki, Chapter 50, "Eastern Cottage", Tokugawa Art Museum, 12th Century.

A escrita chinesa kanji era pronunciada de forma diferente, gerando símbolos fonéticos chamados kana. O hiragana era mais fácil, o katakana era suplementar. Cada um com cerca de 46 signos e dois diacríticos especiais.

As mulheres da corte não tinham o que fazer, então liam muito, mas não achavam interessantes as leituras. Então criaram sua própria literatura. A escreveram em transcrição fonética da língua que as mulheres falavam.

Glicínia

Lady Muraski Shikibu escreve a estória de Genji.

A mulher da época, para ser considerada elegante, tinha de ser bela, escrever com caligrafia elegante, saber música. Devia dominar a poesia, não só ler, mas saber interpretá-la, e criar suas próprias poesias. A necessidade de ter sensibilidade poética na corte Heian era uma obrigação, como o era ter espírito na corte de Luís XIV.

Murasaki Shikibu, nascida entre 970 e 978 e falecida por volta de 1020, foi chamada de To-Shikibu no século XI. To significando fuji, a glicínia, e shikibu, a profissão de seu pai, funcionário do Departamento de Ritos.

 

Estória de Gengi

 

Genji Monogatari Emaki, Chapter 37, “Flute”, Tokugawa Art Museum, 12th Century.

Diz a lenda que Murasaki escreveu A estória de Gengi, “num acesso de inspiração provocado pela contemplação da lua cheia”.[3] Isto teria ocorrido num retiro espiritual no Templo de Ishiyama, que ainda hoje conserva o “quarto de Gengi”.

O livro um de A estória de gengi, chamado A dama do pavilhão de flores roxas, conta do nascimento do filho da favorita do rei e sua ascensão a gengi. O gengi é um príncipe, filho de rei. Ao contrário de um herdeiro de sangue real (shinnô) não pode ascender ao trono.

Tankas

A tradução inglesa de Waley encaixa os pequenos poemas (wakas) como frases entre o texto, algumas vezes em itálico, noutras dentro do texto, ao passo que a tradução portuguesa de Oliveira destaca-os como tankas (poema curto de 31 sílabas, em metrificação 5-7-5-7-7).

Na transcriação a seguir, baseada no texto de Waley, optou-se por divergir da visão de Oliveira quanto ao sentido. Foi decidido também dar títulos aos tankas, alusivos às circunstâncias em que surgem na estória. E a fugir da metrificação 5-7-5-7-7, com adoção dos versos livres.

GENJI MONOGATARI Livro um

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

 

DALBY, Lisa. A história de Murasaki. Trad. de Helena Cardoso.  Lisboa: Gótica, 2001. 487 p.

 

SHIKIBU, Murasaki. O romance do gengi. Tradução, prefácio e notas de Carlos Correia Monteiro de Oliveira. Lisboa: Relógio d’àgua, 2008. 367 p.

 

SHIKIBU, Murasaki. The tale of Gengi. Translation of the Lady’s Murasaki’s  masterpiece by Arthur Waley. London: George Allen & Unwin, 1965. 537 p. 4ª ed. Vol I.

 


[1] Investigadora do Centro de Estudos Clássicos da Universidade de Coimbra.

[2] OLIVEIRA, 2008, p. 9-16.

[3] DALBY, 2001, p. 483.

 

14 FICÇÃO | GENJI MONOGATARI – Livro um

Poema 1

Sussurros de favorita agonizante

pelo menos

através do desejado

nós fomos

porque vou sozinha

como queria viver[4

Poema 2

A criança desprotegida

ao som do vento

que cola o orvalho

na charneca de Takagi,

meu coração vai,

à deriva, no lilás[5]

Poema 3

Coro de grilos sob um céu sem nuvens

incessante

não pára nunca

grilo como sino

a noite toda –

lágrimas caem[6]

Poema 4

Resposta da avó aos grilos

sobre moitas

sussurrantes de insetos

orvalho-lágrimas

de quem vive

nas nuvens[7]

Poema 5

O destino do jovem principe

flor desprotegida do galho

em meio ao vento forte

selvagem e intocada

pelas mãos daqueles

que choram a morte[8]

Poema 6

Lamento ao ver o leque da favorita morta

um mago podia ir

e buscá-la,

por mensageiro ensinar-me

onde seu espírito

repousa[9]

Poema 7

Lágrimas do imperador sob a lua de outono

homens sobre as nuvens

deslizam

quando a lua

submerge

no céu[10]

Poema 8

A taça real

laços púrpura

simbolizam união

diz o pai,

olhando nos olhos

de dois jovens[11]

Poema 9

Réplica do ministro ao brinde real

nada pode dividir

união selada –

nem o desvanecer

de um dos lados

em púrpura[12]

___________________________________________________________________

[4] WALEY, 1965, p. 9.

[5] Id., ibid., p. 11.

[6] Id., ibid., p. 12.

[7] Id., ibid., p. 12-13.

[8] Id., ibid., p. 13-14.

[9] Id., ibid., p. 14.

[10] Id., ibid., p. 14.

[11] Id., ibid., p. 19.

[12] Id., ibid., p. 19.

 

 

 

14 KINEMA | FILMES REGISTRAM O JAPÃO EM LONDRINA

Cartaz do filme Haruo Ohara. Foto: divulgação.
A poesia é o fundamento dos  curta-metragens Haruo Ohara e Satori Uso, dirigidos pelo cineasta  Rodrigo Grota, tendo como foco personagens da história e do imaginário da comunidade japonesa de Londrina.
Os dois  filmes compõem a Trilogia do Esquecimento, série iniciada pelos curtas Satori Uso (2007) e Booker Pittman (2008) e finalizada por Haruo Ohara (2010),  somando  mais de 20 prêmios entre festivais nacionais e internacionais.
O filme sobre Haruo Ohara foi  rodado em julho de 2009 em Londrina e arredores. O elenco está repleto de descendentes de japoneses, interpretando o fotógrafo, a esposa  e seus nove filhos.  Satori Uso também aparece no filme.  As imagens reproduzem as fotos mais famosas de Ohara,  como a do lavrador que equilibra a enxada tendo ao fundo um céu imenso e a da menina que salta de uma escada de mão com a sombrinha aberta  – o bom observador pode notar que essa última foi “roubada” pelo diretor Vicente Amorim e pode ser vista no filme Corações Sujos. Além de reproduzir as imagens das fotos de Ohara, Grota também incluiu um video doméstico produzido pelo próprio fotógrafo.
Ohara morou na cidade a partir dos anos 30 a passou a se dedicar à fotografia de 1938 em diante.  No final de 1970 obtém os primeiros indícios de reconhecimento a sua obra. Antes de morrer, em 1999, viu montarem três exposições individuais sobre sua obra, uma em Londrina, em  1998, e duas em Curitiba, nesse ano e no ano  seguinte.
O filme presta reverência à imagem pura, que Ohara cultivou.  O silêncio, aliás, é uma estratégias narrativas do filme: os diálogos quase sempre são em japonês ou estão em off.
Satori Uso
Cena do filme “Satori Uso”. Foto: divulgação.

Como conta o poeta Rodrigo Garcia Lopes,  Satori Uso nasceu em 1985,   inspirado no zen-budismo e influenciado pelo haiku. Garcia Lopes inventou toda uma biografia para o poeta japonês,  que teria imigrado para Assaí, cidade perto de Londrina, nos anos 50, depois de ter vindo do Japão, ter convivido com os beats na California, e  perder toda a sua obra na viagem de navio para o Brasil.  Uso acaba recebendo um convite da família Akiro para trabalhar no sítio da família na cidade paranaense,   até ser descoberto como o grande poeta japonês desaparecido e  ser assediado por poetas que vinham a seu encontro em seu sítio.

Satori Uso  significa falso brilhante, ou iluminação mentirosa e brinca com conceitos do zen-budismo que se popularizaram no mundo a partir dos anos 60. Uso, por exemplo, prefere as sombras à luz,  vive em ambientes mal iluminados e até há uma cena no filme em que  está deitado ao lado de um aparelho de tevê dos anos 50.  As  sombras aludem  não apenas aos beatniks como também ao cinema e literatura noir, e as narrativas policiais americanas,  que começaram a ganhar o mundo depois da Segunda Guerra Mundial.
As duas produções  estão disponíveis no Youtube.  Veja aqui o filme sobre Haruo Ohara e aqui o de Satori Uso. (MK)

14 HAICAI | HAICAIS DA INDIA

Por Rafael Noris

India: foto de Rajiv Lather.

O haicai só nasceu no Japão, mas sua prática ocorre no mundo inteiro: isso não é novidade.

Em uma recente pesquisa que fiz, tive a oportunidade de conhecer o haicai praticado na Índia. É interessante que alguns poetas transformaram ele num terceto espiritualista, em contraponto com os tercetos espirituosos do Ocidente.

Neste estilo, vale conferir os poemas de Mohammed Fakhruddin, publicados em Haiku Self-Exploration:

O pior dos poderes
É o do dinheiro que compra
Favores de Deus.

A natureza não é livre
Assim são as aves e os pensamentos:
Escravos, assim somos.

A música é divina –
Seu sabor estético é melhor
que o do vinho ou da mulher.

Sem julgar o valor literário deles como tercetos, é claro que comohaicais eles falham: são moralistas e se encaixam muito mais no gênero dos aforismos. Mas isso tem uma desculpa, e quem dá é Angelle Deodhar: na Índia, não há associações ou grêmios onde possam estudar.

Claro que ninguém depende destas organizações para compreender o haicai (embora não seja possível negar a importância delas na divulgação e teorização do haicai).

Kala Ramesh.

Nestas minhas caminhadas pela web tive o prazer de conhecer os versos de Kala RameshRajiv Lather e da própria Angelee Deodhar, estes sim bons haicais que faço questão de compartilhar com vocês.

Haicais de Kala Ramesh:

silenciosamente
recebo as boas-vindas –
mangueira em flor

chuva de inverno –
mais fria que nunca
a tigela de arroz.

moscas
até dentro do templo:
issa

lua de verão –
a espuma branca da onda
dá brilho ao rochedo

Haicais de Rajiv Lather:

fim da primavera –
a velha acácia
continua sem folhas

tarde da noite –
me dirijo ao banheiro
pra terminar o livro

sesta de verão –
em sua quinta tentativa,
a mosca é morta

noite fria –
o apito da chaleira
cala o trem distante

Haicais de Angelee Deodhar:

uma brisa suave –
no banho do pássaro
a lua tremula

ameixeira em flor
entra e sai da sombra do Buda
um par de esquilos

súbito blecaute –
tantos vagalumes
no jardim de casa…

explico ao mestre
meu atraso para o zazen –
a borboleta branca…

***

Saiba mais sobre:

Kala Ramesh – em Tanka Online
Rajiv Lather – em Haryana Online
Angelee Deodhar – em World Haiku

Publicado originalmente aqui.

Rafael Noris é poeta e blogueiro, escreve no Hai-kais.


NOTÍCIA | OSCAR NAKASATO É INDICADO AO JABUTI

 

Jabuti é o terceiro prêmio que Nakasato concorre com Nihonjin.

O romance Nihonjin , de Oscar Nakasato, publicado pela Editora Benvirá (Saraiva) é um dos finalistas do Prêmio Jabuti de Literatura 2012. Nakasato, que é professor na Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), em Apucarana, é natural de Maringa, cidade do norte do estado do Paraná.

O livro, que conta a  história de um imigrante japonês no Brasil,  Hideo Inabata, foi publicado por ter vencido o Prêmio Benvirá de Literatura, em 2010. Em 2011, obteve o Prêmio Literário Nikkei, instituído pelo Bunkyo de São Paulo.

Os  livros que concorrem ao Jabuti foram publicados no Brasil entre 1º de janeiro e 31 de dezembro de 2011. Só o primeiro lugar ganha o prêmio de R$ 3.500. Os segundos e terceiros colocados levam a estatueta do Jabuti.

Os três vencedores de cada categoria serão revelados no dia 18 de outubro. Na premiação, em 28 de novembro, serão conhecidos os dois melhores livros publicados em 2011 em Ficção e Não Ficção – eles ganham R$ 35 mil cada um. (Com informações de O Estado de S.Paulo).

NOTÍCIA | CINEMA JAPONÊS NA TELA GRANDE

Kumakiri: novo cinema japonês

Para quem gosta de cinema japonês, duas dicas essa semana: uma no Festival Indie, em São Paulo e a outra no Anima Mundi, que chega pela primeira vez em Curitiba.  O Festival  Indie, que privilegia a produção fílmica independente,  e segue de 21 de setembro a 04 de outubro,  apresenta três cineastas japoneses:     Kazuyoshi Kumakiri,  Naomi Kawase e cuja obra se carateriza pelo conteúdo  político e extremamente violento é um dos homenageados com uma seleção de nove filmes.   Veja detalhes sobre os filmes aqui.

O estilo de Naomi pode ser conferido em dois documentáros, ” Vestígio” (Chiri, 2012) e” Sentir-se em casa” (2011). O primeiro, um filme autobiográfico e o segundo é uma antologia de 21 filmes (cada um com exatos 3′ 11″ de duração)  feitos em resposta ao  tsunami que atingiu a região de Tohoku no Japão, em 11 de março de 2011 .

Já o diretor Masao Adachi é homenageado pelo cineasta francês Philippe Grandrieux em ” É possível que a beleza tenha fortalecido nossa determinação – Masao Adachi”.

ANIMA MUNDI

Cena do filme “To Aru Hikûshi e no Tsuioku”

O Festival Anima Mundi que acontece de 21 a 27 de setembro, em Curitiba é uma seleção dos 60 melhores filmes das mostras do Rio de Janeiro e São Paulo. A  atração japonesa fica por conta de  To Aru Hikúshi e No Tsutoku , de  Jun Shishido, eleito o melhor longa adulto da competição pelo público do Rio de Janeiro.

Os filmes serão exibidos nos Shopping Crystal e Espaço Itáu  de Cinema. Veja programação completa para  Curitiba aqui.

NOTÍCIA | "MARUGOTO" AINDA INSCREVE

Foram prorrogadas até 06 de outubro as inscrições para o novo curso de língua japonesa “Marugoto”, elaborado com material didático da Japan Foundation, do Japão.  O curso prioriza o uso do Japonês do dia a dia aliado à cultura japonesa, abordando fatos próximos, como a família ou a comida predileta dos alunos. Mais informações aqui.

 

 

 

14 ENTREVISTA | SONIA BIBE LUYTEN E O PODER DO MANGÁ

 

Sonia Bibe Luyten: a primeira a estudar mangá. Foto: Divulgação blogue Sonia Luyten

Em 2012, Sonia Bibe Luyten completa 40 anos de docência em História em Quadrinhos e Cultura Pop Japonesa. Pesquisadora pioneira do mangá na Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo,  é autora dos livros  “Mangá, o Poder dos Quadrinhos” e “Cultura Pop Japonesa”, além de um dos fundadores da Associação Brasileira dos Amigos do Mangá, que viria a se tornar a Associação Brasileira de Desenhistas de Mangá e Ilustração – ABRADEMI.  A pesquisadora ajudou e continua ajudando a desbaratar muitos mitos a respeito do mangá, como o  de que  não era tema para uma pesquisa acadêmica. Contrariando seus opositores, Sonia segue instigando  polêmicas.

Por Marilia Kubota

Revista Quadreca, nos anos 70:pioneirismo

Você foi a pioneira no estudo de mangá no Brasil e no mundo, com a publicação de um artigo na extinta revista Quadreca. Como foi o desbravamento desse campo ?

As HQs, no mundo todo, e o Brasil não  é exceção, estão  ligadas ao desenvolvimento econômico do país.   No  Brasil não há muita leitura de livro porque ainda não há condições plenas para  pessoas de renda baixa ter acesso à escola, comprar livros . O livro é caro, R$50, R$ 60, até para a classe média.  Com o boom econômico do Japão,  nos anos 70,  os jornais passam a ter edições de 10 milhões de exemplares diários  e os mangás, igualmente, 1 milhão / semana. Dinheiro chamando dinheiro. Me chamou atenção a estatística, além de gostar também. Em Sâo Paulo  havia a possibilidade de a gente ter acesso aos mangás japoneses, onde os japoneses os compravam, no bairro da Liberdade. Já existiam pesquisadores de HQ, mas mangá, especificamente, não.

Você teve alguma atração especial pelo estudo do mangá ?

No caso, a cultura japonesa me era muito familiar, eu gostava. Quando juntei o meu campo de estudos, que é Quadrinhos, com a produção de mangá no Japão , eu queria saber por que a tiragem era tão alta, por que a editoração era feita daquele modo. Comecei mais com perguntas  pra poder pesquisar. Meu primeiro contato com o mangá foi na Liberdade, onde havia distribuidoras de revistas de mangá.  Daí comecei a estudar como editavam, a categorização voltada para a faixa etária, sexo, etc.  Foi a partir dessas perguntas é que eu comecei a pesquisar.

 

"One piece", mangá japonês.

Porque você acha que antes nem um pesquisador se aventurou a estudar o mangá, no Brasil e no mundo ?

Por que ninguém se interessava em estudar algo que não era arte erudita. Na USP só se estudava artes como ikebana, shado, shodo, literatura, não arte pop. E o espanto era a pesquisa feita por não-descendente. Posso dizer que a partir do livro Mangá  – o poder dos quadrinhos, que eu escrevi, nos anos 70, a visão sobre o tema mudou. Esse livro foi minha tese de doutorado, ramificou –se como ponta de lançar para muitos outros livros  e estudos acadêmicos.

Um dos tópicos mais críticos de seu livro é quando você  fala sobre  a função social do mangá no Japão e no Brasil …

A função do mangá  no Japão é de extravasamento. No Japão, por exemplo, a palavra otaku, que no Brasil está ligada exclusivamente aos animes, na verdade significa fã. No Japão,  o mangá anime serve como válvula de escape para as fantasias dos fãs  de todas as faixas etárias, principalmente adolescentes e jovens adultos. Criança não, porque até os 7 anos, criança no Japão pode fazer o que quer. A partir de 8, 9 anos, entra na adolescência e o mangá se torna uma válvula de escape de fantasia para fugir do rigor dos estudos.  No Brasil, o mangá também é usado como entretenimento e leva à fantasia, mas esse não é o objetivo maior. Aqui, o fã de anime é considerado imaturo, sofrendo preconceito. No Brasil a fantasia pelo anime não é considerada válvula de escape à repressão social, porque existe o futebol, o carnaval, etc. E em geral o aficcionado de anime mangá não vai pra um estádio de futebol.

Com Robert Crumb, no HQMix. Foto: divulgação.

Então no Japão, o mangá exerce a função de controlar socialmente a população ?

Na minha opinião, é uma maneira de manter o status quo. Enquanto você pode dominar um povo onde se pode fantasiar e não tornar realidade – (no Brasil, através do futebol, no Japão,  através do mangá anime , tudo estará bem, se na vida real todos seguem o mesmo caminho. No Brasil, se o Corinthians ganhar, se xinga, se bate, etc., mas segunda-feira todo mundo vai trabalhar. Dessa forma se alivia a tensão e existe um controle político sobre a massa. Em “Mangá, o poder dos quadrinhos”,  eu falo que o mangá é o ópio do japonês. Por isso, no Japão ninguém queria  publicar, em 1991,  época em que foi lançado.Hoje talvez revissem essa posição.  É muito difícil se olhar no espelho. Se alguém falasse que eu  sou assim, assado, fala isso e aquilo, eu não ia gostar dessa imagem, ia quebrá-la. Ou aceitar. Com o país é a mesma coisa. Estudando anime e manga do Japão, eu pesquiso sobre o imaginário de uma nação. Ninguém gosta de ver essa reflexão, por não ter poder, não ter controle. O que povo fantasia é a sua carência, ou o que odeia e não pode explorar. Vou te dar um exemplo, no Japão. Não trabalho  com mangá erótico nem pornográfico, mas vi e li. Por que na fantasia desses mangás tem sempre a figura da colegial ? Porque o homem adulto quer que a escola vá para o espaço, é o que não gosta.

Maurício de Souza recebe o Troféu HQMIX. Foto: divulgação.

E qual o lado positivo do mangá anime ?

No momento em que o lazer que o mangá anime proporciona e os fãs absorvem, ele entra em contato com outra cultura, ele já vai se modificar na recepção.  O tradutor é muito importante, se não ele vai matar a história. Por exemplo, o gesto de apontar o nariz é eu (watashi). No Brasil, aprendemos uma serei de gestualidades graças aos anime , palavras, expressões que o fã de mangá anime traz para a cultura brasileira e por outro lado, muitos mangás anime são influenciados pela cultura ocidental . Hayao Miyazaki, por exemplo, se inspirou em várias fábulas do mundo inteiro para compor seus animes.

Você chegou a estudar a história do mangá no Paraná  ?

O Paraná teve um significado muito grande no pioneirismo do mangá, por causa da Grafipar, que reuniu quadrinistas, como o Claudio Seto, o Paulo Fukuda, etc.  Mas a Grafipar nos anos 70 passou desapercebida e os artistas mangaká produziram muito, sem que a crítica tenha lhes dado a devida importância. Esses artistas foram influenciados pela leitura dos mangás japoneses , eram nativos na língua japonesa, elaborando uma HQ no estilo mangá, com temas da cultura japonesa, compondo o mangá brasileira. Depois dos anos 60, 70, há um vácuo muito grande. Daí vem uma nova leva de desenhistas influenciados maciçamente pelo anime e mangá, como o Fábio Yabu, um bom exemplo que deu certo a partir da internet, com os Combo Rangers e depois para as sereias.

Qual a diferença entre os mangás produzidos nessa época e os contemporâneos ?Hoje a moçada mostra os quadrinhos para mim e perguntam o que eu acho. O desenho é perfeito, ficam treinando, copiam o traço é sempre bom.  Falta enredo. E sem enredo a HQ não se sustenta. Então os mangaká hoje precisam aprender a fazer enredos. Precisa ter uma história que precisa ter um peso que sustente a curiosidade da leitura. Isso acontece porque o jovem está mais voltado para o desenho e não para o enredo. Ele não lê muito. Hoje existe crise de roteiro. Pra fazer um roteiro, o escritor precisa estar antenado com o mundo. Precisa ter um conhecimento geral básico sobre a humanidade, não só sobre desenho. É duro fazer roteiro, é como escrever um romance. Você precisa ter peso, é um dom. Acho as histórias um pouco fracas.

Que  lembrança você tem de Seto e  Minami Keizi ?

 

Seto recebendo o Troféu HQMix de Serginho Grossman. Ao fundo: Sonia. Foto: Cecília Laszkiewicz.

No ano do centenário da imigração japonesa, pudemos homenagear o Minami Keizi e o Seto com o troféu HQMIx. O personagem Samurai, criado por Seto, foi homenageado.Nesse encontro, na entrega do troféu, reunimos todos os mangáká. Fiquei feliz porque o Seto recebeu essa homenagem um pouco antes de morrer, o que me honra muito.

Você pode contar o que foi  a Abrademi, da qual você foi uma das fundadoras ?

A Associação Brasileira de Desenhistas de Mangá e Ilustração nasceu de um grupo de estudos de mangá da ECA.  Aí esse grupo, comigo, fazia pesquisas sobre mangá. Em 83/84, fizeram uma exposição.  O objetivo da Abrademi  era a difusão da cultura japonesa através do mangá, sem fins lucrativos. Mandavam boletim pro Brasil todo, faziam revistas. Eles foram, junto comigo, os pioneiros a abrir o mangá para o meio universitário.Hoje, em lugar dessas  associações  existem os animencontros, que tem objetivos mais comerciais.

Personagem Doraemon, um dos mais populares.
Doraemon, criado por Fujiko Fujio, desde 2008 “anime embaixador” do Japão. Foto: divulgação.

 

E agora as pesquisas focam os animencontros?

O anime tem muito mais impacto na população jovem do Brasil do que o mangá, até por uma questão de preço.  O mangá traduzido é preciso comprar, da editora JBC, Conrad, etc. O anime se faz download. A internet facilitou a exposição dos jovens a mais animes. O anime tem uma pentração maior do que o mangá.

Os animencontros são vistos com eventos estranhos pelo senso comum. Mas como pesquisadora você procurar compreender a mentalidade dos fás de anime ?

Muitas vezes, na casa, um menino gosta de anime. Se  ele está sozinho na casa, de repente na internet ele acha no RJ ou em Sidney, na Austrália alguém que gosta de anime, eles se juntam em comunidades onde não se sentem sozinhos, sem o estranhamento dos outros e formam uma comunidade. Com isso, conversam  sobre os seus heróis, episódios, etc. e se sentem em segurança do pertencimento de um grupo. Tem até mais força no input, recebendo deles próprios mais força pra poder continuar como fãs. Um fã sozinho fica perdido, porque sofre muito preconceito, principalmente no Brasil, onde se  diz  que o desenho animado , história em quadrinhos é coisa de criança. Os fás de anime são tachados de infantis, imaturos, o que não é verdade. No Japão, o desenho animado não é só para crianças.

Por que você  usa a expressão “lixo cultural” para designar a cultura pop ?

Porque  cultura pop ainda é considerada lixo cultural. Sempre quando me apresento como especialista em HQ, me perguntam: não podia ser algo mais elevado ? Quando eu falo em eventos, a minha pesquisa é considerada “diversão”. Mas eu acho que o quadrinho é poderoso, é educativo, a criança quebra muito a cabeça pra pode rler uma imagem complexa, pra entender todos os signos da história. Mesmo sem saber ler, ela decodifica os signos – coração quer dizer amor, gotinhas querem dizer suor, etc. Seguindo um mangá, a criança segue uma história em linguagem descontinua (quadrinhos) numa linguagem contínua (narrativa). E o mais importante do mangá é o que está entre um quadrinho e outro. É aí que a criança desenvolve a imaginação. As pessoas não sabem ler imagens.

E a gente vive numa era de imagens.

Há tanta exposição de imagens que as pessoas não lêem mais. Não presta atenção, o uso das cores nas imagens, os detalhes, etc.  O mangá anime aprofunda a cultura visual. A melhor maneira de reforçar a cultura visual é fazer um desenho, criar um personagem, uma história. Assim elas se tornam heroínas. Por isso eu falo para os pais e professores não usar o mangá anime como inimigo, mas como aliado.Se proíbem é porque não conhecem a linguagem e o poder dos quadrinhos.  Não existe coisa melhor para uma criança do que ela entrar no mundo da fantasia. Pq a criança sabe diferenciar o que é realidade e fantasia. N é todo mundo que vai por uma capa de superman e sair na janela voando. Se uma criança fizer isso, ela é doente, não os quadrinhos. Não é porque joga game, vê desenho animado, lê quadrinhos que a criança se torna violenta ou anormal.

Marilia Kubota é editora do JORNAL MEMAI, mestre em estudos literários (UFPR) e organizadora do livro “Retratos Japoneses no Brasil – Literatura Mestiça” (2010).

 

 

 

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